sexta-feira, 6 de maio de 2011

Reforma do Estado e a Redução do N.º de Municípios e Freguesias: Uma Questão Oca

Faço aqui um pequeno desvio na temática deste blog para abordar uma temática que me é muito próxima, a do municipalismo!
Acredito que com toda esta questão da redução do n.º de municípios, estão a querer aplicar em Portugal a mesma receita da Grécia, mas esquecem-se que, para uma população idêntica, a Grécia tem 1.034 municípios (que agora vão reduzir para 355) e em Portugal existem já e só e apenas 308 municípios, o que atendendo à nossa dimensão dá uma média de 30.000 hab. / município, que penso ser uma média adequada e razoável, há no entanto outras razões para afirmar que este assunto é uma questão oca, senão vejamos:

A grande reforma municipal foi feita em 1836 (ou seja tem 150 anos!) – a reforma de "Passos Manuel", em que foram então reduzidos o número de municípios de 785 (muitos eram pequenos municípios com origens senhoriais) para 355, e que depois através de reformas sucessivas em 1853, 1855 e 1895 (as principais) se reduziram para 291 municípios.

No período da 1.ª República (1910-1920) foram criados 8 municípios:
Bombarral (1914)
Alpiarça (1914)
Ribeira Brava (1914)
Alcanena (1914)
São Brás de Alportel (1914)
Castanheira de Pêra (1914)
Marinha Grande (1917)
Sines (1917, extinto desde 1895)

No período de 1920 a 1980 (abrangendo sobretudo o Estado Novo, marcado por uma exagerada tendência centralista), e embora a população portuguesa tivesse crescido de 6 milhões de habitantes para 10 milhões de habitantes (1920-1980) só foram criados mais 6 novos municípios, o que deve ser caso único em todo o mundo, a saber:
S. João da Madeira (1926)
Murtosa (1926)
Palmela (1926, extinto desde 1895)
Entroncamento (1945)
Vendas Novas (1962),
Amadora (1979, era então a maior freguesia da Europa com cerca de 180.000 habitantes)

Daí para cá, e apesar o despesismo dos governos do Centrão, só foram criados mais 3 municípios em 1998:
Odivelas
Trofa
Vizela

E só não foram criados mais outros 2 municípios (Canas de Senhorim e Fátima), porque infelizmente alguém se esqueceu do povo que o elegeu e decidiu chumbar 2 Projectos de Lei aprovados por unanimidade na Assembleia da República.

Todos nós sabemos que a melhoria das condições e qualidade de vida das nossa cidades e vilas, sobretudo a partir do 25 de Abril de 1974, seria impossível sem o poder autárquico, imaginem agora, como alguns pretendem, se fizessem pequenas Secretarias de Estado em cada uma das autarquias, seria regredir 40 anos. As necessidades económicas devem nos obrigar a pensar melhor o estado, mas não podem por em causa o direito que os cidadãos têm de escolher os seus representantes, quer nacionais, quer locais, e por alguma coisa as eleições autárquicas são as que têm maior participação e menor nível de abstenção (já agora veja-se o que acontece com as Eleições Europeias!).

A melhoria da eficácia da administração do estado faz-se com ética e transparência, e não com teorias economicistas, mas mesmo assim sob ponto de vista económico algumas ideias brilhantes acabam por cair por terra, dou a título de exemplo dois casos:

(1) Pela lógica da proximidade e da economia de escala todas as autarquias da Grande Lisboa deviam ser fundidas numa única, poupando recursos e meios, no entanto a Câmara Municipal de Lisboa é a autarquia portuguesa com o maior passivo e a Câmara Municipal de Almada, é uma das que melhores indicadores financeiros apresenta! No mundo empresarial quando uma grande empresa está em dificuldades económicas não compra outras mais pequenas, normalmente o que acontece é que a grande divide-se em empresas mais pequenas, sobrevivendo as áreas de negócio mais viáveis e acabando com as menos viáveis …

(2) Pela lógica da dimensão, Barrancos, um dos mais pequenos municípios do país, com 1.700 habitantes, devia ser extinto, mas ao fazê-lo acabar-se-ia com um dos maiores empregadores da vila, e todos nós sabemos que uma Junta de Freguesia com o mesmo número de habitantes nunca poderá ter um Orçamento sequer próximo ao da Câmara. Sendo uma das vilas mais isoladas do país, acabar com a Câmara significa matar toda e qualquer esperança de futuro para esta terra, e o se o mesmo acontecesse noutras localidades do interior, os resultados seriam muito idênticos, tornando o país cada vez mais inclinado …

Mas perguntamos nós, há necessidade de rever e melhorar a administração local? A resposta é evidente, é claro que há, rever, melhorar, reestruturar, e não como simplisticamente se apregoa, fundir, diminuir ou acabar, porque não é acabando com municípios mais pequenos que se ajudam a resolver os problemas do nosso país.

Para exemplificar o que estou a afirmar fiz um pequeno exercício de análise e comparação de indicadores entre dois municípios, uma grande e um pequeno, da mesma Região (os números são aproximados, mas a disparidade representa bem o que pretendo demonstrar, embora admita haver outras comparações entre outros municípios que possam provar diferenças menos significativas, desafio a quem quer que seja a fazer esta mesma análise):

Alcochete
Orçamento Anual (aprox.)
20 milhões
Rácios
1.250 € /hab

N.º habitantes (aprox.)
16.000 hab.

50.000 € /func

N.º funcionários (aprox.)
400 funcionários

1 func / 40 hab










Lisboa
Orçamento Anual (aprox.)
1.000 milhões euros

1.770 € / hab

N.º habitantes (aprox.)
564.000 hab.

90.900 € /func

N.º funcionários (aprox.)
11.000 funcionários

1 func / 50 hab

Um município maior não é necessariamente mais eficaz, nem gere melhor os dinheiros públicos, pois dos 3 indicadores escolhidos, valor do orçamento municipal por n.º habitantes e por n.º de funcionários municipais e n.º de funcionários municipais por habitante, só neste último o município maior demonstra ser mais eficaz.

Aliás o último indicador vem entroncar numa segunda questão, a teoria de que o país tem muitas freguesias e que há que acabar com tantas freguesias, pois isto significa um desmultiplicar de funcionários incomportável para o nosso Orçamento, ora verificamos que com os orçamentos disponíveis, as nossas Juntas de Freguesia fazem verdadeiros milagres, e deixo mais um exemplo (contas aproximadas),

 
Uma Junta de Freguesia de pequena dimensão para digamos uma aldeia de 300 habitantes terá um presidente da Junta em regime de «Não Permanência» mais 2~3 funcionários, o que dá uma média de 1 funcionário / 75 habitantes (veja-se os exemplos acima), sabemos também que os funcionários da Junta representam menos custos de pessoal que os das Câmaras pois há muito menos técnicos superiores e outros cargos intermédios da administração pública, e que o Presidente da Junta «não permanente» ganha muito menos que outros autarcas, logo feitas as contas podemos admitir um custo médio mensal, no exemplo que citei, de cerca de 2.000 € e anual de cerca de 30.000 €, ou seja um custo anual de 100 € / habitante (ou seja 1 décimo do rácio orçamental municipal).

Se aplicarmos à Junta de Freguesia um rácio orçamental de 400 € / habitante (mesmo assim 1/3 do rácio municipal) facilmente iríamos concluir que para uma população de 300 habitantes um Orçamento equilibrado para uma Junta de Freguesia representaria cerca de 120.000 €, que se descontarmos os 30.000 € de recursos humanos daria cerca de 90.000 € para investimentos e outras despesas, e nós sabemos que em Portugal nenhuma Junta de Freguesia para 300 habitantes tem um orçamento assim tão elevado, por isso pergunto, ainda há quem acredite que é por causa das nossas Juntas de Freguesia que as Finanças do estado estão de rastos, duvido?

Há quem nos Gabinetes de Lisboa não ligue nada à importância dos municípios e das freguesias e que ache que todo o dinheiro gasto a mais de 50 km de Lisboa é um puro desperdício de dinheiro, bem talvez seja melhor transformar o resto do país num parque de diversões ou num Museu de História Natural para os Turistas estrangeiros e Tecnocratas feitos turistas de fim-de-semana visitarem de vez em quando …

Há claro uma questão muito mais importante que a questão económica … querer substituir um Presidente de Junta ou de Câmara que conhece todos ou quase todos os seus concidadãos por um funcionário num Gabinete ou um Delegado Municipal que se possível for ainda nos olha de lado, não muito Obrigado!

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